Discussão:Desconto salarial
O Princípio da Intangibilidade Salarial e os Descontos Salariais
O ordenamento jurídico brasileiro, em especial o Direito do Trabalho, consagra o princípio da intangibilidade salarial. Este princípio, previsto no art. 462 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), estabelece que é vedado ao empregador efetuar qualquer desconto nos salários do empregado. O objetivo é proteger a remuneração do trabalhador, garantindo que ele receba integralmente a contraprestação pelo seu trabalho, dada a sua natureza alimentar.
Contudo, a própria legislação prevê exceções a essa regra, permitindo descontos em hipóteses taxativas. FMSIA (discussão) 23h31min de 15 de novembro de 2025 (UTC)
Hipóteses Legais de Descontos Salariais
O caput do art. 462 da CLT autoriza os descontos que resultem de:
- Adiantamentos salariais: Pagamentos antecipados feitos pelo empregador, que podem ser deduzidos no pagamento do salário do mês correspondente.
- Dispositivos de lei: Descontos obrigatórios, como a contribuição previdenciária (INSS), o imposto de renda retido na fonte (IRRF) e a contribuição sindical, quando aplicável.
- Contrato coletivo: Descontos previstos em Acordos ou Convenções Coletivas de Trabalho, desde que negociados e aprovados pela entidade sindical representativa.
Descontos por Danos Causados pelo Empregado
Uma das exceções mais sensíveis é a prevista no § 1º do art. 462 da CLT, que trata dos descontos por danos causados pelo empregado. A validade desses descontos depende de requisitos específicos:
- Dano Doloso: Se o dano for intencional (dolo), o desconto é lícito e independe de acordo prévio. Contudo, o empregador tem o ônus de comprovar a intenção do empregado.
- Dano Culposo: Se o dano ocorrer por negligência, imprudência ou imperícia (culpa), o desconto só será lícito se esta possibilidade tiver sido previamente acordada no contrato de trabalho.
A jurisprudência do TST é firme no sentido de que a mera existência de cláusula contratual autorizativa não é suficiente. Para que o desconto por dano culposo seja válido, é imprescindível a comprovação da culpa do empregado. Não se pode presumi-la.
TST — Ag-AIRR 101337-94.2016.5.01.0009 — Publicado em 09/09/2022 A jurisprudência do TST firmou-se no sentido de que não é suficiente o ajuste autorizando os descontos salariais, sendo necessária também a comprovação do dolo ou da culpa do empregado pelos prejuízos causados, o que não ocorreu no caso, sendo devida a devolução dos valores irregularmente descontados.
TST — RR 10814-03.2018.5.15.0130 — Publicado em 06/05/2022 O TST reconheceu a ilicitude de descontos pela perda de ferramentas com base na presunção de culpa dos trabalhadores, reforçando que a legislação e a jurisprudência pacífica não admitem tal presunção, exigindo prova concreta.
Descontos para Integração em Planos de Benefícios
São muito comuns os descontos para incluir o empregado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou em entidades cooperativas e culturais.
Nesses casos, a validade do desconto está condicionada à autorização prévia e por escrito do empregado, conforme a Súmula nº 342 do TST:
Súmula nº 342 do TST: "Descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o disposto no art. 462 da CLT, salvo se ficar demonstrada a existência de coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico."
Portanto, a autorização não pode ser tácita e deve ser livre de qualquer vício de consentimento.
TST — RR 325000-90.1997.5.02.0053 — Publicado em 20/11/2009 Segundo o entendimento da Súmula 342/TST, os descontos para planos de saúde, seguro e previdência privada são válidos se houver autorização prévia e por escrito do empregado. Fora essa hipótese, nenhum desconto pode ser realizado, ainda que se deduza a anuência tácita.
Limite de Desconto na Rescisão Contratual
No momento da rescisão do contrato de trabalho, o art. 477, § 5º, da CLT estabelece um limite para as compensações. Qualquer compensação no pagamento das verbas rescisórias não poderá exceder o valor equivalente a um mês de remuneração do empregado.
O TST entende que essa limitação se aplica inclusive a dívidas de natureza trabalhista, como adiantamentos salariais, visando garantir recursos mínimos ao trabalhador no momento do desligamento.
TST — E-ED-ARR 10016-78.2016.5.03.0087 — Publicado em 01/12/2023 A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI-1) do TST fixou o entendimento de que a compensação entre crédito e débito de natureza trabalhista está sujeita ao limite de um mês de remuneração, não estando excepcionados os descontos autorizados pelo art. 462 da CLT e pela Súmula nº 342 do TST.