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Ação rescisória

De Edpo Augusto Ferreira Macedo
Revisão de 01h52min de 2 de outubro de 2025 por FMSIA (discussão | contribs)

AÇÃO RESCISÓRIA (AR). É uma ação judicial autônoma, de natureza constitutiva negativa, que tem por objetivo desconstituir uma decisão judicial de mérito que já transitou em julgado, ou seja, que está protegida pela autoridade da coisa julgada material. Por ser uma medida excepcional que ataca o princípio da segurança jurídica, ela não serve como um novo recurso para corrigir eventuais injustiças. Seu cabimento é restrito às hipóteses taxativamente previstas em lei e deve ser ajuizada dentro de um prazo decadencial de dois anos.

O instituto está integralmente disciplinado no Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015).

Código de Processo Civil

  • Art. 966 (Enumera as hipóteses de cabimento da ação rescisória).
  • Art. 967 (Define a legitimidade para propor a ação).
  • Art. 968 (Dispõe sobre os requisitos da petição inicial, incluindo o depósito prévio).
  • Art. 975 (Estabelece o prazo decadencial de dois anos para a propositura da ação).

Desenvolvimento teórico

Para que uma Ação Rescisória seja admitida, é necessário o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos:

Decisão de mérito

O pronunciamento judicial que se busca rescindir deve ter analisado o mérito da causa (conforme Art. 487 do CPC).

Trânsito em julgado

A decisão não pode mais ser objeto de qualquer recurso; deve estar acobertada pela coisa julgada material.

Hipótese de cabimento

A causa de pedir da ação deve se enquadrar em uma das hipóteses do rol taxativo do Art. 966 do CPC. O rol do Art. 966 é exaustivo. As causas mais comuns para a rescisão de uma sentença são:

Prevaricação, concussão ou corrupção do juiz

Vícios que afetam a imparcialidade do julgador.

Incompetência absoluta do juízo

Quando a ação foi julgada por juiz absolutamente incompetente.

Dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida

Vícios de conduta processual que influenciaram o resultado.

Ofensa à coisa julgada

Quando a decisão que se busca rescindir contraria outra decisão transitada em julgado anteriormente.

Violar manifestamente norma jurídica

Uma das hipóteses mais invocadas, exige que a decisão tenha aplicado a lei de forma teratológica, aberrante, e não apenas adotado uma interpretação controvertida.

Fundar-se em prova cuja falsidade tenha sido apurada

Quando a prova essencial para a decisão é comprovadamente falsa.

Obtenção de prova nova

Quando o autor obtém, após o trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar resultado favorável.

Erro de fato verificável

Quando a decisão admite um fato inexistente ou considera inexistente um fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável que não tenha havido controvérsia sobre o fato.

Prazo decadencial

A ação deve ser proposta no prazo de 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

Procedimento e competência

A Ação Rescisória é de competência originária dos tribunais. Por exemplo, uma ação para rescindir uma sentença de um juiz de primeira instância é ajuizada diretamente no Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal ao qual ele está vinculado. A petição inicial deve, sob pena de indeferimento, ser acompanhada de um depósito de 5% sobre o valor da causa, que servirá como multa caso a ação seja, por unanimidade, declarada inadmissível ou improcedente.

O julgamento da rescisória se divide em duas etapas:

Iudicium rescidens (Juízo rescindente)

O tribunal analisa se a hipótese de rescindibilidade (ex: violação à lei) está presente. Se sim, desconstitui a decisão anterior.

Iudicium rescissorium (Juízo rescisório)

O tribunal analisa se a hipótese de rescindibilidade (ex: violação à lei) está presente. Se sim, desconstitui a decisão anterior.

Observações

A Ação Rescisória não pode ser utilizada como um sucedâneo recursal, ou seja, como uma nova chance para rediscutir a matéria ou corrigir uma interpretação judicial que a parte considera injusta. A inconformidade com o resultado, por si só, não autoriza seu manejo.

O prazo de dois anos é decadencial, o que significa que ele não se suspende nem se interrompe, sendo fatal para o exercício do direito.

Jurisprudência vinculante

Violação manifesta de norma jurídica

Esta é uma das hipóteses mais invocadas. Para que seja admitida, a violação da norma deve ser clara, direta e evidente, não bastando uma simples alegação de injustiça ou má interpretação da lei.

  • REsp 2159384: A violação manifesta de norma jurídica (art. 966, V, do CPC) pressupõe que inexista controvérsia interpretativa nos tribunais à época em que proferida a decisão rescindenda.

Necessidade de debate prévio

  • AgInt na AR 7428: O STJ entende que, para a configuração da violação, é indispensável que a norma jurídica tida por violada tenha sido objeto de debate e pronunciamento na decisão que se busca rescindir. A ausência de manifestação judicial sobre o dispositivo legal impede o cabimento da rescisória por este fundamento.

Interpretação controvertida

  • Súmula 343 do STF: Não cabe Ação Rescisória quando a decisão rescindenda se baseou em texto legal com interpretação controversa nos tribunais à época do julgamento. Essa é a orientação da Súmula 343 do STF, aplicada com frequência pelo STJ para indeferir pedidos rescisórios que buscam apenas reverter uma interpretação judicial por outra que se tornou prevalente posteriormente.

Mudança de entendimento pelo STF

  • REsp 2066696: Uma exceção importante ocorre quando o STF, em controle de constitucionalidade, altera um entendimento consolidado. Nesses casos, o STJ tem admitido a Ação Rescisória para adequar o julgado anterior à nova orientação da Suprema Corte, conforme fixado em tese de recurso repetitivo.