Discussão:Poderes instrutórios do juiz
Posição do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O STJ entende que a moderna sistemática processual civil confere ao magistrado amplos poderes instrutórios. O juiz é o destinatário final da prova e, portanto, tem o poder-dever de determinar a produção de provas que considere essenciais para a formação de seu convencimento e para a busca da verdade real, garantindo uma decisão justa e efetiva.
A jurisprudência do STJ esclarece os seguintes pontos:
- Busca da Verdade Real: A iniciativa probatória do juiz é vista como um instrumento para a efetividade da Justiça, permitindo uma reconstrução mais fiel dos fatos.
- Livre Convencimento Motivado: O poder de determinar provas de ofício está diretamente ligado ao princípio da persuasão racional (ou livre convencimento motivado), pelo qual o juiz deve fundamentar sua decisão com base nas provas dos autos.
- Inexistência de Preclusão: Para o magistrado, não ocorre a preclusão em matéria probatória. Isso significa que, mesmo que as partes tenham perdido o prazo para solicitar uma prova, o juiz pode determiná-la se a julgar indispensável para a solução da lide.
Limites dos Poderes Instrutórios
Apesar da amplitude, os poderes instrutórios do juiz não são ilimitados. A atuação de ofício deve observar certos parâmetros:
- Necessidade da Prova: A prova determinada deve ser estritamente necessária para o esclarecimento de pontos controvertidos e para o julgamento do mérito.
- Fundamentação: A decisão que determina a produção de prova de ofício deve ser devidamente fundamentada, explicando sua pertinência e relevância para o caso.
- Contraditório: Deve ser sempre garantido o direito ao contraditório, permitindo que as partes se manifestem sobre a prova a ser produzida.
- Proibição de Provas Ilícitas: O juiz não pode, obviamente, determinar a produção de provas obtidas por meios ilícitos.
- Rejeição de Diligências Inúteis: Compete também ao juiz indeferir as diligências que considerar inúteis ou meramente protelatórias.
A seguir, apresento algumas decisões do STJ que consolidam esse entendimento:
STJ — AgInt no AREsp 2174003 SP 2022/0225217-5 — Publicado em 28/09/2023 Segundo o art. 370 do CPC, "caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito", o que demonstra a discricionariedade e o poder instrutório do juiz.
STJ — AgInt nos EDcl no AREsp 2227335 RN 2022/0320271-9 — Publicado em 28/09/2023 O Código de Processo Civil de 2015 manteve o princípio da persuasão racional, reafirmando que compete ao magistrado dirigir a instrução probatória, podendo determinar, de ofício, as provas que entender necessárias.
STJ — AgInt no AREsp 2029044 GO 2021/0370909-2 — Publicado em 22/09/2022 Em matéria de instrução probatória, não há preclusão pro judicato (para o juiz), pois os princípios da busca da verdade e do livre convencimento motivado afastam a preclusão dos poderes instrutórios do juiz.
STJ — REsp 1677926 SP 2015/0222243-7 — Publicado em 25/03/2021 A iniciativa probatória do magistrado, em busca da veracidade dos fatos, com realização de provas até mesmo de ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.
STJ — AgInt no AREsp 1525948 SP 2019/0171563-7 — Publicado em 25/03/2021 Esta Corte Superior perfilha o entendimento no sentido de que não ocorre a preclusão pro judicato em matéria probatória, sendo possível ao magistrado determinar a produção das provas essenciais à composição da lide.
Em resumo, a atuação do juiz na produção de provas é um poder-dever que visa assegurar que a decisão final seja a mais justa e fundamentada possível, equilibrando a gestão da prova com o respeito ao contraditório e à ampla defesa. FMSIA (discussão) 18h32min de 17 de outubro de 2025 (UTC)
Produção de Provas Após o Encerramento da Instrução
O juiz pode determinar a produção de provas mesmo após o encerramento da fase de instrução. Embora não seja a regra, o magistrado tem a prerrogativa de converter o julgamento em diligência para a produção de provas que considere indispensáveis para a formação de seu convencimento e para a correta solução da lide.
Essa possibilidade se fundamenta nos mesmos princípios que permitem a produção de provas de ofício durante a instrução: a busca da verdade real e o princípio do livre convencimento motivado. O juiz, como destinatário da prova, não está adstrito a uma análise passiva do que foi apresentado pelas partes.
Como Funciona na Prática?
Após o encerramento da instrução e, por vezes, até mesmo após a apresentação das alegações finais, o juiz pode se deparar com uma dúvida crucial ou com a ausência de um elemento probatório que considera essencial para proferir uma sentença justa. Nesse caso, ele pode baixar os autos em diligência e determinar, de ofício, a realização de uma perícia, a oitiva de uma testemunha ou a juntada de um documento.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem um entendimento consolidado de que essa iniciativa não se sujeita à preclusão temporal para o magistrado. Ou seja, o poder-dever do juiz de buscar a verdade não se esgota com o fim da fase instrutória.
E o Contraditório e a Ampla Defesa?
A principal preocupação ao reabrir a fase de provas é a potencial violação ao contraditório e à ampla defesa. O STJ é firme em estabelecer que a conversão do julgamento em diligência deve, obrigatoriamente, respeitar essas garantias.
Isso significa que, após a produção da nova prova, as partes devem ser intimadas para se manifestar sobre ela. Essa oportunidade é crucial para que possam impugnar a prova, apresentar contraprovas ou simplesmente argumentar sobre seu conteúdo antes que a sentença seja proferida. A ausência dessa etapa pode, sim, gerar a nulidade do ato e da sentença subsequente.
Posição do STJ
A jurisprudência do STJ reforça essa possibilidade, desde que observados os devidos cuidados:
- Faculdade do Julgador: A conversão do julgamento em diligência é uma faculdade do juiz, a ser utilizada em casos especiais, quando a prova for indispensável para o esclarecimento de dúvidas.
- Inexistência de Preclusão pro judicato: Em matéria probatória, não há preclusão para o juiz, que pode determinar a produção de provas essenciais a qualquer momento antes da sentença.
- Observância do Contraditório: É imprescindível que, após a produção da prova em diligência, seja garantido às partes o direito de se manifestarem.
Abaixo, algumas decisões do STJ que ilustram esse posicionamento:
STJ — AgInt no AREsp 949795 SP 2016/0181680-7 — Publicado em 19/11/2019 A iniciativa probatória do magistrado, em busca da veracidade dos fatos alegados, com realização de provas de ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.
STJ — AgInt no AREsp 2294626 SC 2023/0023805-8 — Publicado em 25/05/2023 O entendimento do Tribunal a quo está alinhado à jurisprudência do STJ, quanto à possibilidade de o juiz converter o julgamento em diligência se entender necessário, pois, sendo ele o destinatário da prova, cabe-lhe determinar aquelas que entenda necessárias à formação do seu convencimento, observando o contraditório.
STJ — AgRg no HC 564148 RJ 2020/0050459-3 — Publicado em 15/06/2020 No caso, o Juízo processante, após a apresentação das alegações finais, converteu o julgamento em diligência, para determinar a apresentação de informações por instituições financeiras, o que não gera ofensa ao princípio acusatório e encontra previsão legal no art. 156, inciso II, do Código de Processo Penal.
STJ — REsp 1229905 MS 2010/0223211-0 — Publicado em 02/09/2014 A jurisprudência do STJ é sedimentada em reconhecer a possibilidade da conversão do julgamento em diligência para fins de produção de prova essencial, como o exame de DNA em questão, principalmente por se tratar de ação de estado.
Portanto, embora o encerramento da instrução represente o fim da fase ordinária de produção de provas, o juiz mantém a prerrogativa de determinar diligências para a produção de provas essenciais, desde que o faça de forma fundamentada e assegure o contraditório às partes antes de proferir sua decisão final. FMSIA (discussão) 18h34min de 17 de outubro de 2025 (UTC)