Ação direta de inconstitucionalidade
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI). É o principal instrumento do controle concentrado e abstrato de constitucionalidade no Brasil. Trata-se de uma ação judicial, de competência originária do Supremo Tribunal Federal (STF), proposta por um rol restrito de autoridades e entidades com o objetivo de declarar que uma lei ou ato normativo federal ou estadual é incompatível com a Constituição Federal. A decisão proferida em uma ADI possui efeitos gerais (erga omnes) e vinculantes, invalidando a norma questionada para todos.
Fundamentação legal
O regime jurídico da ADI está previsto diretamente na Constituição Federal e detalhado em lei específica.
Constituição Federal
- Art. 102, I, 'a': "Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual...".
- Art. 103: Elenca, em rol taxativo, os nove legitimados para a propositura da ADI.
Lei nº 9.868/1999
Dispõe sobre o processo e julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade e da Ação Declaratória de Constitucionalidade perante o STF.
Desenvolvimento teórico
A ADI é a ferramenta por excelência para a defesa da ordem constitucional em tese, permitindo que a compatibilidade de uma norma com a Constituição seja discutida diretamente, sem a necessidade de um caso concreto entre partes.
Requisitos
Objeto
O que pode ser impugnado via ADI? Leis e atos normativos federais ou estaduais. Ficam excluídos: leis municipais (impugnáveis via ADPF), leis anteriores à Constituição de 1988 (que são analisadas sob a ótica da recepção), e atos normativos sem generalidade e abstração (como um decreto de nomeação).
Parâmetro
O padrão de confronto é a Constituição Federal. A alegação deve ser de que o objeto viola, formal ou materialmente, o texto constitucional.
Legitimados ativos
Apenas um grupo restrito pode propor a ADI, nos termos do Art. 103, da Constituição Federal. A jurisprudência do STF os divide em duas categorias:
Legitimados universais
Podem questionar qualquer norma, sobre qualquer tema. São eles: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e os partidos políticos com representação no Congresso Nacional.
Legitimados especiais
Precisam demonstrar que a norma impugnada tem relação direta com seus interesses institucionais (pertinência temática). São eles: a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do DF, os Governadores de Estado ou do DF, e as confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
Características principais
Caráter abstrato
O processo não envolve interesses subjetivos ou um litígio entre partes, mas a defesa objetiva da supremacia da Constituição.
Medida cautelar
O STF, por maioria absoluta de seus membros, pode conceder uma medida cautelar para suspender a eficácia da lei impugnada até o julgamento final da ação, caso haja urgência e plausibilidade na alegação de inconstitucionalidade.
Efeitos da decisão de mérito
A decisão que julga uma ADI procedente produz os seguintes efeitos:
Eficácia erga omnes
Vale para todos, e não apenas para as partes do processo.
Efeito vinculante
Obriga todos os demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública direta e indireta (federal, estadual e municipal) a seguirem o entendimento firmado pelo STF.
Efeito ex tunc (retroativo)
Em regra, a declaração de inconstitucionalidade retroage, tornando a lei nula desde a sua origem.
Modulação de efeitos temporais
O art. 27, da Lei nº 9.868/1999, permite que o STF, por maioria de 2/3 de seus membros, restrinja os efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Essa modulação temporal pode determinar que a decisão só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado (ex nunc) ou de outro momento a ser fixado, visando a preservar a segurança jurídica ou por excepcional interesse social.
Jurisprudência relevante
Aplicação clássica da ADI
- ADI 4650: Proposta pelo Conselho Federal da OAB (legitimado universal), esta ADI questionou a constitucionalidade de dispositivos de leis federais que permitiam o financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas. O STF julgou a ação procedente, declarando a inconstitucionalidade das normas por violação aos princípios da soberania popular e da isonomia. A decisão, com eficácia erga omnes e vinculante, invalidou a prática em todo o Brasil, sendo um exemplo paradigmático do poder do controle concentrado.
Aplicação da modulação de efeitos
- ADI 2240: O STF, em diversas ADIs, julgou inconstitucionais leis estaduais que criaram novos municípios sem a observância das regras previstas na Constituição Federal. Contudo, reconhecendo o caos social e administrativo que a anulação retroativa (ex tunc) desses municípios causaria (pois já existiam há anos, com prefeito, vereadores, escolas, etc.), a Corte aplicou a modulação dos efeitos temporais. Foi decidido que as leis eram inconstitucionais, mas que os municípios não seriam extintos, fixando-se um prazo para que o Congresso Nacional regulamentasse a matéria, preservando a segurança jurídica.
Ver também
- Controle de Constitucionalidade
- Supremacia da Constituição
- Constituição Federal
- Supremo Tribunal Federal (STF)
- Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC)
Referências
- MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva, 2023.
- SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. Editora Malheiros, 2023.
- BARROSO, Luís Roberto. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro. Editora Saraiva, 2019.
- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Editora Atlas, 2023.